Iniciativa deu-se após intenso debate entre Poder Público, mercado e entidades, representantes das empresas, sobre os impactos negativos da comunicação mercadológica voltada para o público infantil.

Na última semana, 24 empresas do setor alimentício, representadas pela Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia) e pela Associação Brasileira dos Anunciantes (Aba), anunciaram um compromisso público que prevê a autorregulamentação de publicidade de alimentos dirigida a crianças no Brasil.

Assinaram o documento Ambev, Batavo, Bob’s, Burger King, Cadbury, Coca-Cola Brasil, Danone, Elegê, Ferrero do Brasil, Garoto, General Milss Brasil, Grupo Bimbo, Grupo Schincariol, Kellogg’s, Kraft Foods, Mars Brasil, McDonald’s, Nestlé Brasil, Parmalat Brasil, PepsiCo Alimentos, PepsiCo Bebidas, Perdigão, Sadia e Unilever Brasil.

Inédita no País, a iniciativa deu-se após intenso debate entre o Poder Público, o mercado e entidades a respeito dos impactos negativos da comunicação mercadológica voltada para o público infantil, que, comprovadamente, contribui para os altos índices de obesidade e outros problemas de saúde decorrentes da ingestão de alimentos com alto teor de açúcar, sódio e gorduras trans e saturadas.

Para a equipe do Projeto Criança e Consumo, do Instituto Alana, a ação é um passo importante na defesa dos direitos das crianças. “Esse compromisso representa um avanço nas discussões em torno da publicidade voltada para o público infanto-juvenil no Brasil e um reconhecimento da indústria alimentícia de que a publicidade é fator de influência no consumo excessivo de alimentos não saudáveis, bem como nos crescentes índices de obesidade infantil. Esperamos que o compromisso fortaleça uma postura empresarial mais responsável”, afirma Isabella Henriques, coordenadora geral do Criança e Consumo.

As empresas signatárias devem seguir três regras estabelecidas pelo documento, dentre as quais está não mais anunciar produtos pouco nutritivos para crianças de até 12 anos de idade. Cada companhia deverá preparar seus próprios códigos de conduta para a questão até o fim deste ano.

O presidente da Abia, Edmundo Klotz, classificou a ação como “voluntária e espontânea.” Isabella Henriques acredita que a pressão da sociedade como um todo e, especialmente, a Consulta Pública nº 71 da Anvisa para a regulamentação estatal da questão tiveram influência na decisão das empresas. “Não há dúvidas de que os encontros promovidos pela Agência ao longo dos últimos três anos tiveram grande importância para a construção do documento apresentado por essas empresas. Esse é fruto de uma sociedade democrática, que busca o consenso e o diálogo entre os diversos interesses”, lembra Isabella.

Já o vice-presidente da Aba, Rafael Sampaio, aproveitou o anúncio do compromisso para reafirmar a posição da entidade com relação às discussões de regulamentação publicitária no Ministério da Saúde e de projetos de lei em trâmite no Congresso Nacional: “O Conar tem um código exemplar e, esse documento reafirma o compromisso da indústria com essa questão. Mas é preciso ter cuidado com posturas anacrônicas. Jamais devemos deixar de falar com o público infantil, pois ele deve se preparar para viver no mundo do consumo responsável.”

A coordenadora do Projeto Criança e Consumo, no entanto, chama a atenção para os impactos negativos do consumo desenfreado no desenvolvimento saudável de crianças. “As relações de consumo são extremamente complexas e exigem um grau de consciência que uma criança não tem. Até os 12 anos de idade, a criança ainda está em processo de formação física e psíquica, por isso não compreende plenamente a linguagem persuasiva da comunicação mercadológica”, explica. “Por isso, é importante que essa iniciativa do setor alimentício não iniba o Poder Público de continuar a trabalhar a questão de maneira uniforme, para criar regras válidas perante todas as empresas do segmento alimentício e não só às signatárias do compromisso, bem como com a previsão de sanções e normas ainda mais contundentes na defesa dos direitos das crianças.” finaliza.

Em setembro de 2008, o Conselho Federal de Psicologia divulgou uma cartilha em que esclarece as razões pelas quais as publicidades dirigidas às crianças são prejudiciais ao desenvolvimento infantil. Outros estudos, em todo o mundo, também apontam para problemas relacionados ao investimento maciço do mercado publicitário em crianças de até 12 anos.