O mundo volta a ser palco de uma intensa disputa entre as duas maiores potências econômicas. Enquanto Estados Unidos e China trocam ameaças comerciais, o Brasil precisa, mais do que nunca, enxergar esse embate como uma oportunidade de se reposicionar estrategicamente no cenário global.

A recente escalada das tensões entre Washington e Pequim — reacendida pela ameaça de Donald Trump de impor tarifas adicionais de 50% sobre produtos chineses — renova o temor de uma guerra comercial em larga escala. Para países exportadores como o Brasil, os impactos podem ser significativos, tanto pelas incertezas nos fluxos de comércio quanto pelos efeitos indiretos sobre a competitividade da indústria nacional.

Mais do que as tarifas em si, o maior risco está no redirecionamento de produtos chineses para outros mercados. Se os EUA fecharem ainda mais suas portas, o Brasil pode se tornar um dos destinos desse excedente. Setores como o têxtil, o eletrônico e o de bens de consumo duráveis estariam diante de uma concorrência intensa, com produtos de baixo custo e alto volume pressionando o mercado interno.

Ao mesmo tempo, a China se movimenta com agilidade. Acelera sua diplomacia econômica e avança em acordos regionais estratégicos. Um exemplo claro é a intensificação das negociações de um acordo de livre comércio com Japão e Coreia do Sul. Se firmado, esse pacto formará um bloco altamente competitivo, com grande capacidade de atrair investimentos e redesenhar cadeias produtivas globais — especialmente no setor de alta tecnologia.

Mas nem tudo representa ameaça. Momentos de ruptura também trazem oportunidades. A disputa entre China e EUA já impulsionou o agronegócio brasileiro. A soja nacional se consolidou como principal alternativa à americana no mercado chinês, e produtos como carnes, algodão e açúcar vêm conquistando espaço.

Além disso, a entrada de produtos chineses, embora desafiadora, pode ser um estímulo à modernização do setor produtivo brasileiro. A pressão concorrencial pode impulsionar investimentos em inovação, eficiência e diferenciação. Também abre espaço para parcerias estratégicas com empresas chinesas, favorecendo a transferência de tecnologia e a geração de empregos no Brasil.

No entanto, é essencial que o país atue com inteligência regulatória. Caso se confirme uma onda de importações, o governo deve adotar critérios claros — como exigência de contrapartidas produtivas, acordos de conteúdo local e mecanismos de defesa comercial — para proteger setores sensíveis e garantir que a abertura de mercado traga ganhos reais à economia.

Paralelamente, as tensões comerciais deflagradas pelos Estados Unidos contra produtos chineses e asiáticos criam uma janela estratégica para o Brasil ampliar sua presença no mercado norte-americano. Com o redesenho das cadeias globais de suprimentos, empresas brasileiras têm a chance de ocupar o espaço deixado por concorrentes penalizados com tarifas mais altas.

Setores como agronegócio, alimentos processados, produtos químicos, têxteis e calçados podem ser diretamente beneficiados. Produtos brasileiros com qualidade internacional e preços competitivos tendem a se tornar mais atrativos para os compradores americanos — especialmente se o país garantir regularidade na oferta e eficiência logística.

Além disso, a busca dos EUA por diversificar seus fornecedores em áreas estratégicas — como minerais críticos, insumos industriais e semicondutores — abre espaço para que o Brasil negocie acesso preferencial, por meio de acordos bilaterais que reduzam barreiras e incentivem investimentos produtivos conjuntos.

Para que essas oportunidades se traduzam em crescimento sustentável das exportações, o país precisa de agilidade diplomática e articulação institucional. É fundamental que o setor privado, em parceria com o governo, identifique rapidamente os nichos com maior potencial e reforce a promoção comercial nos Estados Unidos. Investimentos em certificações, rastreabilidade e marketing internacional serão determinantes para garantir uma presença sólida e confiável no maior mercado consumidor do mundo.

O mundo caminha para um novo arranjo econômico. E o Brasil não pode ficar à margem.
Não basta torcer — é preciso jogar com inteligência.

Henry Uliano Quaresma é CEO da Brasil Business Partners e membro de conselhos de empresas e entidades empresariais. Foi Diretor Executivo da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (FIESC), onde participou ou coordenou mais de 90 missões empresariais internacionais em mais de 50 países. Atuou como professor universitário, em indústrias e no setor público. É engenheiro, com MBA em Administração Global pela Universidade Independente de Lisboa, especialização em Marketing pela FGV, e formação executiva em Estratégia e Gestão pela Wharton School (EUA) e pelo INSEAD (França). É autor de artigos e livros, com destaque para “O Fator China: Oportunidades e Desafios” (2024), obra referência na área empresarial.
[email protected]