O dia 29 de Setembro de 1968 foi doloroso para dois gênios da música brasileira. Chico Buarque e Tom Jobim amargaram uma vaia de doer na alma, quando os jurados do II Festival da Canção da TV Globo anunciou, no Maracananzinho, que sabiá (aquela música que elevou mais alto seus talentos) havia obtido o primeiro lugar.
A platéia, composta em sua esmagadora maioria por jovens universitários, queria que a primeira colocação fosse conferida à canção revolucionária de Geraldo Vandré: “Prá não dizer que falei de flores”.
O tempo passou, fomos “caminhando e cantando” e derrubamos a ditadura. A canção de Vandré ficou como um registro histórico de um momento importante de denúncia contra a censura, a tortura, as eleições indiretas e todos os entulhos autoritários do regime de 1964.
No entanto, “Sabiá” (sem a popularidade fácil das “ah, se eu te pego”) vai se afirmar, lá na frente, como aconteceu com o “Carinhoso”, de Pixinguinha, que ficou décadas no anonimato e hoje é uma referência do cancioneiro nacional.
Muitos países exaltam, na música, seu pássaro-símbolo. No Paraguai, por exemplo, é o “Pajaro Campana”. Com uma maestria sem igual, Luiz Bordón reproduz na harpa o canto da ave que os guaranis chamam de “Sino Guyrá”, seguindo os acordes da polca criada pelo compositor Carlos Talavera.
A música peruana exalta o Condor. Extraída de uma peça teatral que denuncia a exploração dos trabalhadores locais por uma empresa estrangeira, a tristeza da canção “El Condor Pasa” reflete o desejo de liberdade do povo andino, inspirada no vôo livre do grande pássaro que plaina soberano sobre as altas cordilheiras.
Os descendentes dos incas extraem da “zampoña” (a versão sulamericana da primitiva harmônica de boca) uma dolente linha musical, que reflete a paisagem melancólica do altiplano do Pacífico.
Composta por Daniel Robles, “El Condor Pasa” foi declarada patrimônio cultural do Perú.
Os romenos, com a flauta de pan que notabilizou, em todo o mundo, Gheorghes Zanfir, interpretam, com a mesma maestria da harpa paraguaia e da “zanpoña", sua música-simbolo, refazendo o canto do rouxinol, nos moldes dos acordes da Rapsódia Romena, do consagrado maestro George Enescu.
Com a mesma versatilidade de um Zanfir ou de um Bordon, Jacó, Valdir Azevedo ou o nosso Bera (que só não ficou famoso porque nunca quis sair de Joinville) dedilhavam, no bandolin e no cavaquinho, o “Tico-tico no Fubá”, de Zéquinha de Abreu.
Talento precoce, Zéquinha de Abreu, mineiro de Santa Rita do Passa Quatro, compôs e estreiou nesta cidade mineira, o “Tico-tico”, que originalmente era “no farelo”.
Celebrizada por Carmen Miranda, “Tico-tico no Fubá” integrou a trilha sonora de vários filmes norte-americanos, como “Saludos Amigos”, “A Filha do Comandante”, “Escola de Sereias” e “Copacabana”, que foram sucessos nos anos 1940.
O trinado de muitos outros pássaros tem sido imitado pela voz de cantores e pela destreza de músicos notáveis. Aliás, foi o canto das aves que inspirou Johan Strauss a compor a valsa-símbolo do romantismo austríaco: “Conto dos Bosques de Viena”.
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